Treinar em superfícies macias como a terra e a grama costuma ser a recomendação padrão para quem se lesionou ou tem medo de se machucar. Mas, acredite, nem sempre essa é a melhor escolha. Ao contrário do que se costuma imaginar, engatar passadas nessas superfícies pode agravar ainda mais os danos. “Se você tem a tendência de torcer o tornozelo facilmente (como eu), pode não ser uma boa ideia correr em pisos irregulares. Prefira um terreno regular como o asfalto e use um tênis com bom amortecimento”, sugeriu à Sport Life Hirofumi Tanaka, do Departamento de Cinesiologia e Educação para a Saúde da Universidade do Texas (EUA).
Tanaka conta que, recuperando-se de uma lesão no joelho, passou a correr em terrenos macios e o resultado foi desastroso. Uma torção de tornozelo e o agravamento da lesão. Resolveu, então, procurar de onde vieram as recomendações de que o asfalto seria um “vilão”. Resultado: não encontrou qualquer evidência científica sobre o assunto.
Na verdade, pode até ser mais fácil se machucar em superfícies macias. “Pisos macios são normalmente indicados por uma questão de conforto ou de preferência. O problema é que há mais risco de o corredor ter uma lesão aguda (como entorse de tornozelo). Além disso, esses terrenos exigem uma atividade muscular diferente e por vezes mais intensa, o que pode aumentar a fadiga”, explica Stuart Warden, diretor do Centro de Pesquisa Musculoesquelética da Universidade de Indiana (EUA).
O fato é que existem vários tipos de superfície e vários tipos de treino; portanto, não há uma receita de bolo. Confira as vantagens e desvantagens de cada tipo de piso:
Grama
Prós: tem a vantagem de diminuir a sobrecarga plantar e, com isso, possivelmente diminuir a sobrecarga nas articulações. Segundo Vitor Tessutti, pode ser uma bela alternativa para quem trota descalço, porque acaba trabalhando a musculatura intrínseca do pé, justamente uma das responsáveis por todo o amortecimento do impacto.
Contras: tem como desvantagem o fato de que a instabilidade característica do piso pode gerar outro tipo de lesão, traumática. “Por conta disso, sugiro a grama para o treino longo, sem foco em performance. Além disso, claro, é necessário escolher bem o gramado. Quanto menos buracos, mais seguro”, diz Tessutti.
Areia
Prós: o treino tiver como foco o fortalecimento e maior utilização do sistema cardiovascular, a areia fofa da praia é uma ótima escolha, com pouquíssimo impacto. “Temos de lembrar também que, muitas vezes, a instabilidade é utilizada com o intuito de fortalecimento. Assim, em alguns casos, o retorno à corrida após a lesão pode ser iniciado com poucos minutos em uma superfície instável, aumentando progressivamente o tempo de corrida. Se a lesão for uma fratura por estresse, por exemplo, colocar o corredor logo no asfalto não seria a melhor opção”, pondera Vitor Tessutti. Treinos feitos na areia fofa são um excelente trabalho para a musculatura da panturillha e uma ótima oportunidade de correr descalço num ambiente superprazeroso.
Contras: se utilizada com frequência, aumenta muito as chances de lesões musculares e no tendão de aquiles. Por se tratar de uma superfície instável, não é indicada para quem está iniciando na corrida. Comece correndo na areia dura (aquela mais próxima da linha da maré).
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Corrida no concreto
Prós: não há.
Contras: é apontado por treinadores como a pior superfície, pois a densidade do material é a mais alta de todas (acredita-se que seja cerca de 10 vezes mais duro que o asfalto), não permitindo que a força se dissipe.
Asfalto
Prós: a imensa maioria das provas têm como palco esse tipo de terreno. “É o piso padrão dos atletas, já que é muito difícil para a absoluta maioria dos corredores fugir por completo desse tipo de superfície”, diz Danilo Balu, treinador formado em esporte pela USP. O asfalto é uma das superficies mais rápidas que há; portanto, é a melhor opção para treinos de velocidade, se os objetivos forem desempenho e performance. Mais: o asfalto estressa menos o tendão de aquiles do que terrenos mais macios.
Contras: “É importante lembrar que o nível de impacto e a solicitação do sistema ósseoarticular é bem maior”, aponta Balu.
Terra batida
Prós: esse tipo de piso (uma estrada de terra ou trilhas, por exemplo) tem uma vantagem que o asfalto nunca terá, que é a variação do ângulo em que o atleta faz o contato com o solo, o que possibilita treinar diferentes músculos de forma distinta a cada pisada. “A pessoa que corre em trilhas muda o ângulo da coxa com o quadril e também os ângulos em que o joelho faz o trabalho. Portanto, treinos nesse terreno são um excelente trabalho de força específica na corrida”, diz Danilo Balu.
Contras: quando molhada, pode ficar lamancenta e aumentar o risco de lesões, especialmente no tendão de aquiles e panturrilha. E não é sempre que os corredores têm a oportunidade de treinar nesse tipo de terreno.
Texto e Pesquisa: Marina Gomes | Edição: Victor Moura